sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

O que você fez comigo - Capítulo 2

Suas mãos delicadas passaram a escova pela extensão dos meus fios escuros. Escovou meus cabelos com delicadeza e lentidão. Os juntou com as mãos e amarrou-lhes em um rabo de cavalo baixo. Colocou brincos em minhas orelhas e lançou-me um sorriso forçado. Apenas continuei encarando o espelho em minha frente.

- Farei uma maquiagem básica, apenas para melhorar esse rostinho.

Dei de ombros. Essa maquiagem esconderia minhas olheiras, mas seria impossível maquiar, esconder minhas emoções tão nítidas até em meus olhos.

***

Megan empurrou minha cadeira de rodas até a primeira fila de cadeiras. Olhei ao redor e avistei tantos rostos conhecidos. Na primeira fileira, a qual eu estava, mamãe, David, Thomas (pai do Log) e Ryan (seu amigo médico). Espalhados pelas outras filas estavam muitos outros companheiros de trabalho do Logan. Conheci cada um deles na época que passei pelo acompanhamento. Alguns parentes distantes do Logan também compareceram à cerimônia.
Imaginei a dor que sua mãe sentiria se estivesse ali, principalmente no estado que se encontrava alguns anos atrás. Eleanor não fora uma boa mãe para o Log, mas eu sabia que o amava, qual mãe, mesma da sua maneira louca, é incapaz de amar um ser que saiu de dentro dela?

Um pastor, conhecido do Thomas, iniciara a cerimônia, uma espécie de "culto fúnebre". Falou sobre a dádiva que é viver e sobre a única certeza que temos, a morte. Lamentou por nossa perda e nos consolou dizendo que o Logan foi para um lugar melhor.
O Thomas começou a falar sobre os seus momentos com o Logan. Sorriu em meio às lágrimas contando situações engraçadas, depois, desabou no choro e não conseguiu falar mais nada. Ryan representou o hospital e também honrou o médico incrível que o meu marido fora. Marido, eu sequer tinha conseguido me acostumar com essa palavra, agora precisaria conviver com "viúva".

- Amy, você deseja falar algumas palavras? - Thomas indagou baixinho.

Assenti e ele empurrou minha cadeira para frente, fazendo todos os olhares se voltarem para mim. Engoli em seco.

- Sabe, nós estávamos indo para o Regent's Park, sempre adoramos esses programinhas. Eu e o Logan caminhávamos de mãos dadas pelo gramado e conversávamos sobre besteiras. - Dei de ombros. - Era só mais um dia comum. - Senti a primeira lágrima descer pela minha bochecha. - A morte não quer saber se é um dia comum, ela só acontece. - Torci os lábios. - Isso é uma droga, sabia? - Sorri sem graça. - Nós estávamos casados e felizes, esperando um bebê que aumentaria ainda mais a nossa alegria. O Logan ficou louco quando descobriu. Todos os dias ele conversava com o bebê. - Parei por alguns segundos. - Ele estava fazendo aquelas vozes fofas quando tudo aconteceu. Ele estava falando com o filho, contando o quanto estava feliz por saber que estava perto deles se conhecerem de verdade.

Eu já soluçava quando terminei de falar. Meu coração batia descompassadamente, minha mente fora invadida por pensamentos dolorosos.

- Querida... - Thomas me abraçou. - Você não precisa continuar, se não quiser.

- Eu quero. - O afastei.

Enxuguei minhas lágrimas e encarei as pessoas a minha frente.

- Eu o amei todos os dias, desde que o conheci. - Sorri. - Eu sou tão nova, uma hora todos dirão que eu devo arrumar um novo amor, mas não é algo que eu queria... Eu tive uma bela história, em? - Abri um sorriso largo. - Essa seria a história que eu gostaria de contar para os nossos filhos e netos... - Fechei os olhos sentindo um turbilhão de emoções me invadirem. - Nossa... Isso é doloroso. Nós amamos intensamente sem imaginar que um dia isso possa acontecer. Ninguém nos prepara para isso, não é mesmo?

Eu gostaria de falar tantas coisas que já não sabia mais o que falar. Poderia falar de como nos conhecemos, das loucuras que enfrentamos, do nosso casamento, da descoberta da minha gravidez... Foram tantas maravilhas, mas elas estavam mergulhadas em um mar de dor e sofrimento. Naquele momento, só quis gritar para o mundo todo ouvir o quanto eu estava furiosa por tê-lo perdido.

- Meu Deus... Eu não posso enterra-lo. - Desesperei-me. - Como conseguirei viver sem nunca mais ver o seu rosto? Não, não... - Toquei no caixão. - Por favor...

- Amy, você precisa deixá-lo ir. - Mamãe me abraçou.

- Mãe, eu não consigo. É ele, é o Logan. É o meu marido. - Choraminguei. - Mãe, eu perdi o meu bebê, ele deveria estar ao meu lado para me consolar. Meu Deus... Nossa... - Passei a mão pelo meu cabelo. - Eu ainda sinto como se ele estivesse aqui. - Apontei para a barriga. - Eu não vou conseguir sem o Logan.

Eu não dispunha de opções.

Observei de longe as pessoas jogarem rosas sobre o seu caixão. Aos poucos, o cemitério ficou vazio e frio. Olhei os túmulos ao redor e imaginei quantas mulheres sofreram como eu estava sofrendo. Quantas famílias abaladas, perdidas.
Com dificuldade, empurrei minha cadeira até o seu caixão. Pedi para que abrissem para mim, precisava me despedir.

- As pessoas costumam dizer que o tempo cura todas as feridas, meu amor. - Toquei em suas mãos frias. - Você abriu em mim uma ferida grande demais para um dia ser sarada. Eu sei que nada disso é culpa sua, mas eu te odeio um pouquinho por ter ido antes de mim. - Sorri em meio às lágrimas. - Eu sempre te disse que queria ir antes, você trapaceou, espertinho. - Encostei minha cabeça em seu peito. - Prometo que nunca esquecerei dos seus olhos azuis que adoravam me deixar sem graça ao me olhar sem piscar. Também não esquecerei dos seus beijos, do seu toque, do seu corpo... Nós sempre seremos um único corpo, Logan. - Acariciei o seu rosto. - Não te direi Adeus. Eu nunca te deixarei. Meu pensamento sempre estará em você.

Assenti para que fechassem o caixão e pus uma rosa sobre o mesmo. O meu marido e filho estavam realmente mortos.

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