Tomei um banho quente, vesti uma roupa confortável e desci as escadas. Minha mãe e a Maisie conversavam animadamente sobre alguma coisa, enquanto o meu pai estava sentado em um poltrona lendo um livro. Ele me olhou por cima dos óculos e com a cabeça indicou que eu fosse para a área da piscina.
- Acho que você precisa de alguém para conversar, meu filho.
- Eu não sei se quero conversar, pai. - Sentei em um banco e olhei para o céu.
- Talvez você não queira, mas precisa. Sou seu pai, seu amigo desde sempre.
- Eu sei.
Desde que inicie minha carreira como médico, não dispus de muitos amigos íntimos, não existia muito tempo para isso. Meu pai estava ali, talvez eu devesse contar o que eu estava sentindo.
- Quer começar pela Maisie?
- Eu não sei como me envolvi com a Maisie. - Sorri incrédulo. - Temos pensamentos opostos, sonhos diferentes... Eu não vejo um futuro ao lado dela, e nem desejo isso.
- E o que te prende?
- Eu não sei.
Talvez eu estivesse há tanto tempo com a Maisie, que estava acomodado em nossa rotina de brigas e de falta de cumplicidade. Não éramos casados, mas levávamos essa vida. Talvez por nunca ter sentido o que hoje estou sentindo, não cogitei terminar tudo.
Me apaixonei pela Maisie e esse fora o meu maior erro, achar que a paixão e o desejo nos manteria juntos e unidos.
- Vocês estão juntos há tantos anos, o que te fez querer terminar tudo?
Eu abri um sorriso largo mas logo tentei disfarçar. Amy. Eu só conseguia pensar na mais linda paciente que já tive, e no quanto eu me sentia ligado a ela.
- Qual o nome dela, Log? - Meu pai sorriu. - Seja feliz, filho.
- Seu nome é Amy Watson.
- E o que te impede de ficar com a garota que você gosta? - Indagou confuso.
- O coma profundo em que ela se encontra. - Senti meu coração apertar dentro do peito. - Amy se tornou minha paciente no início do mês depois de sofrer um acidente. Desde esse dia, ela não sai da minha cabeça.
- Filho... - Meu pai lamentou e me abraçou em seguida. - Espero que a Amy possa sair dessa.
É, eu também. Parecia loucura admitir que em menos de um mês eu estava perdido de amores por uma garota praticamente morta. Amy não tinha muitas chances de se recuperar, mas eu estava apaixonado demais para acreditar nisso. Preferia me agarrar na ideia de que ela acordaria.
***
No dia 31 de dezembro, Grace apareceu com algumas sacolas no quarto da Amy. Pediu ajuda a uma enfermeira para colocar uma roupa diferente daquela bata sem cor. Havia conseguido uma excessão para aquele dia.
Sabia que Amy amava essa data, e mesmo sem poder dizer palavra alguma, Grace sabia que ela ficaria feliz.
Seu vestido era tão bonito e delicado, uma combinação perfeita com aquele rosto sereno.
Grace penteou seus cabelos, fez uma trança bonita e sorriu ao observar a filha. Uma lágrima solitária escorreu em seu rosto, mas tratou de seca-la e de acreditar que aquilo era apenas um obstáculo que sua filha enfrentaria na vida.
- Eu sei que você ainda irá comemorar essa data por vários e vários anos.
***
Um novo ano estava iniciando. Amy permanecia em coma há um mês. A cada dia que se passava, mais difícil era acreditar que um dia ela abriria seus olhos e voltaria a vida.
Naquela manhã, entrei em seu quarto, depositei um beijo delicado em sua testa e suspirei. Coloquei um pequeno vaso com algumas tulipas ao lado de sua cama e comecei a falar com a garota. Descobri na noite anterior, através de suas publicações em redes sociais, que aquelas eram as suas flores preferidas.
- Quando você acordar, prometo levá-la a um campo de tulipas. - Falei enquanto acariciava seus cabelos.
- TIRA A MÃO DA MINHA NAMORADA, SEU OTÁRIO! - Um alguém até então desconhecido gritou ao entrar no quarto.
- Quem é você? - O encarei colocando-me de pé.
- O NAMORADO DA AMY. - Ele começou a se aproximar de mim. - E quem você pensa que é para tocar nela dessa maneira? Você quer apanhar? - Ele falou me prendendo pelo jaleco.
Ri e acertei um soco em seu rosto, que enfurecido, devolveu o golpe.
- SOCORRO! - Gritou uma enfermeira ao presenciar nossa briga.
Já estávamos jogados no chão, trocando socos. Os seguranças chegaram, retirando o idiota de perto de mim. Senti meu sangue ferver.
- EU QUERO FICAR COM A MINHA NAMORADA! - Reclamou.
- Não estamos em horário de visitar. - Sorri irônico.
- EU VOU MATAR VOCÊ! - Ele gritou mais uma vez, partindo para cima de mim, mas foi impedido pelos seguranças.
- Levem ele embora. - Ordenei.
- Dr., precisamos cuidar desses ferimentos. - A enfermeira aproximou-se, apontando para os cortes no meu rosto.
Toquei em meu nariz e observei o sangue nos meus dedos. Até então eu não havia sentindo nada além do ódio ao saber que aquele imbecil a tinha para si.
- Claro, vamos lá.
Deixei o quarto de Amy e caminhei até a enfermaria, onde recebi os devidos cuidados. Os cortes foram leves comparados aos que eu deixei em seu rosto. Nem para bater ele servia.
Comecei a imaginar o processo que seria aberto contra mim, e o possível afastamento do caso de Amy. Desesperei-me com a ideia de ficar longe da menina. Amy fazia parte da minha vida e eu não conseguiria abrir mão de ser seu médico. Precisava dela tanto quanto ela precisava de mim.
- Logan, me acompanhe. - Falou um funcionário do setor administrativo.
- Ok.
O caminho até o bloco administrativo tornou-se um momento de inquietação. Preocupei-me apenas com a possibilidade de ficar longe de Amy.
- O que aconteceu, Logan? O que ocorreu não faz parte do seu comportamento.
- Eu me senti ameaçado e acabei me excedendo.
- Nos conte a história do começo.
- É realmente necessário? - Indaguei constrangido.
- Foi aberto um processo contra você. Precisamos ouvir os dois lados.
- Imaginei. O que ele disse?
- Que você abusou de uma paciente incapaz de se defender, e o agrediu por tentar defende-la.
- ISSO É MENTIRA! - Gritei indignado. - A Amy é minha paciente, estava apenas interagindo com ela. É essencial que haja interação com pacientes em coma, faz parte do tratamento.
- Você não passou dos limites com essa interação?
- Claro que não. - Neguei irritado. - O indivíduo entrou sem permissão e gritando, logo me ameaçou e eu apenas me defendi. - Dei de ombros.
- Ele pediu o seu afastamento do caso.
- Como é que é? Ele não pode fazer isso, conheço tudo sobre o caso da Amy.
Desejava tê-la em meus braços. Sentir seu corpo quente nas manhãs frias de Londres. Receber seu abraço mais forte. Acariciar seu rosto e vê-la sorrir. Mexer em seus cabelos até que ela pegasse no sono. Mas jamais a tocaria com segundas intenções, a menos que ela me permitisse.
***
Depois de um verdadeiro interrogatório, fui liberado. Precisavam contatar a família da Amy sobre o que aconteceu.
Meu coração batia mais rápido a cada segundo que se passava. Só conseguia imaginar a Grace concordando com o infeliz do namorado da Amy, o qual eu não sabia da existência. Vasculhei todas as suas redes sociais e não existia nada sobre os dois. Talvez tivessem um relacionamento como o meu e da Maisie: péssimo. Espero.
- Afastar o Dr. Price do caso? Claro que não. Confio inteiramente na competência dele. Ele cuidou da minha filha até agora, fez o que pode por ela.
- Grace, ele abusou do poder de médico. - O indivíduo insistiu.
- Dylan, não deixe que os seus ciúmes o levem a uma acusação tão baixa. - Ela torceu o lábio. - O Dr. Price tem feito de tudo pela Amy, se não fosse por ele, ela não estaria mais aqui, querido.
- Obrigado, Sra. Watson. - Sorri para ela.
- Então o Dr. Price permanece no caso, MAS - Ele deu ênfase à palavra. - responderá um processo por agressão, assim como o Sr. Harris.
Agradeci imensamente à Sra. Watson pelas suas palavras e por me permitir continuar ao lado de sua filha. Ela não sabia o quanto eu precisava da Amy. Ela não fazia ideia do sentimento que crescia dentro de mim.
- Logan? - Ela me olhou de modo sereno.
- Sim? - Indaguei virando-me para ela.
- Você está apaixonado por ela, mas não deveria.
- Eu não... - Fui interrompido por sua voz suave.
- Sim, você está. Observo a maneira que você olha para a minha menina, o olhar mais puro que eu já vi. Um olhar de amor.
- Sra. Watson, eu... - Mais uma vez ela me interrompeu, dessa vez com um abraço apertado.
- Tenho medo de que minha filha nunca acorde e você se decepcione.
- Isso não acontecerá. Ainda que a Amy não acorde, serei grato por olhar o seu rosto todos os dias.
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